o ar…

“Prezado Mauriço,Sou paulistano, já atuei muito como DJ e hoje sou fotógrafo, atuando profissionalmente há bastante tempo. Mas uma paixão tão grande como a fotografia, só a música mesmo. Já discotequei nas pistas do Aeroanta e do Dama Xoc nos 90, entre outros locais menos transitados mas tão alternativos quanto.

Seu desabafo e relato (dia 2), no ticotico, me deixaram um pouco deprê, por conta  do que já perdemos e da perspectiva sobre o que vamos ter que aguentar no futuro, mas existe sempre um outro lado, o lado B…

É curioso como as coisas acontecem, e nos vemos às voltas com algumas coisas
que temos em comum. Soube que trabalhou com a gabaritada Ana Maria Bahiana
(quem descobri sendo uma das primeiras pessoas a publicar ensinamentos e
impressões sobre rock, MPB e afins)… …vivi no Rio de Janeiro no início
dos 90, onde tinha a oportunidade de desfrutar das bases que você incorporou
à Fluminesne FM e claro na Globo FM. Radios com programação bacana,
inovadora e descolada, dava de 10 nas outras rádios do Rio de Janeiro e de
São Paulo, pra onde voltei e por onde eu sempre permaneci rodando mesmo
morando no Rio, raras as exceções das USP fm, Brasil 2000 (onde também
botava o bedelho para fazer sessions de Zappa, Reggae e lados B de bandas as
quais a audiência conhecia apenas o superficial e mais vendido, claro que
por conta das programaçõe$) e uma 89 mezzo mussarela mezzo jabá.

A rádio me lembrava a Nova Excelsior do início dos 80 (com o Kubrusly), com
uma programação que não permitia a repetição da mesma música num prazo de
vinte dias. Os caras tocavam um disco do Frank Zappa inteiro por programa,
no Prisma, baita programão… …conversei com o Kubrusly no ano passado,
mas notei que o cara adquiriu uma característica “global” que desmontou dele
aquele ar inovador e bacana praca, infelizmente. Era também um professor…

Por tudo o que sempre ouvi, por tudo o que aprendemos a ouvir, pelas dicas e
pelas valiosas informações das entrelinhas, só posse te agradecer e
estimular a continuar na pista, saindo do tráfego constante e repetitivo.

Outra coisa bacana,  que me foi forte referência, foi ter podido frequentar
quase todos os programas “Fabrica do Som”, transmitido pela TV Cultura nos
80’s, e poder transitar com toda esse gente que algum dia fez musica boa,
com independência, aprender com aqueles que tocam e compõe sobre suas
fontes, driblando os produtores, subvertendo, enfim, a industria fonográfica
sanguessunga, mas conhecer e seguir trabalhos de músicos foi o que sempre me
orientou para saber como pesquisar outros bons músicos e assim por diante.
Claro que entrar na galeria do Rock e arredores, visitando Baratos Afins,
Wop Bop, London Calling e a Modern Sound, do Rio, trazia um frio na espinha
ao ver o que existia e acontecia fora da Brasa, o que rolava pelo mundo.

Mas como dizia Fiori Gigliotti, o temmmmpo passa, things change, e o mundo
tem uma nova ordem e a ordem, infelizmente, é consumir por consumir, vender
barato e sem consequências. O que não nos pode abalar (*), sei que exitem os
locais específicos para esse prosopopéia toda, e tem gente que pode sim
bancar essas idéias. Este ano, tive a oportunidade de ver Bootsy Collins com
sua banda completa, equipamentos e engenheiros de som todos “importados”,
tocando no meu vizinho Sesc Pompéia, às custas de módicos dezrreal. Também
levei a patota toda (a mulher e os três filhos) pra ver Uakti na mesma
unidade por R$ 5,00. Ontem, dia 6, a dose foi cavalar… …assisti a um show do Nuno Mindelis e banda por R$ 3,00 !!! Ao dizer isso para o Nuno, ele confirmou: “Impressionante, é um milagre, pois nos pagam bem esses caras !”

Claro, aqui em casa somos comerciários e pagamos uma
merreca pra ver o que tem de bom e muita qualidade, e a rede Sesc ajuda. Mas
ao observar esta benevolência criticamente, sabemos que as coisas ali
funcionam por um motivo bem positivo, pois os artistas comentam que são bem
pagos, e a audiência sorri com os preços praticados lá. Funciona porque a
finalidade do Sesc não é criar demanda, atingir metas ou simplesmente vender
produtos em escala chinesa, vendem cultura para atender a pouca demanda
existente, raramente não consigo comprar o ingresso que quero, sempre tem
disponível apesar de ter que “ficar esperto” pra não acabar…

Conversando com o Danilo Miranda – Diretor Regional do Sesc SP –
pessoalmente, parece que atingir a utopia é algo comum naquele local. E não é só com a música, também ocorre com artes, cursos, atividades esportivas… Melhor
pra nós !!

Musica para mim é tão importante e vital quanto o ar que respiro, não rotulo
musica por estilo ou músico ou banda ou regionalismo ou nacionalidade,
costumo dizer para os que gostam de minhas dicas de bons sons (confesso que
muitas vezes elas vem de seus sopros fabulosos, mas sempre concedo os
créditos desta origem preciosa, indicando o Ronca pros desatentos, como as
demais fontes) que classifico as musicas em dois quesitos apenas: as musicas
boas e as musicas ruins. E é estranhamente ridículo saber diferenciar uma da
outra, o que parece impossível para a maioria das pessoas ao redor… …mas o que parece querer nos tirar do prumo é que os produtores, a mídias e os programadores das radios que estão aí sabem disso muito bem, mas trabalham com o inverso de nossas necessidades: optam pelo ruim, pelo mau gosto, pelo grotesco, porque é o que vende.

Mas sei que vai acalmar essa baderna toda, e nós temos que fugir do banal, sim. E ter essa coragem sua, muitas vezes, beliscando o próprio torso, o que não podemos abrir mão das convicções e principalmente, do que é verdadeiro.

(*) sofro com esse probelma já a alguns anos, existem hoje uma legião de
“fotógrafos” que foram pra Disney e trouxeram uma Rebel na bagagem, que
moram com o papai e estão com as contas pagas e responsa zero. Desembarcam
aqui já com o título de Fotógrafo Profissional, e se admiram de fazer
trabalhos “bacanas” como cobrir uma festa de gente “popular”, cobrando
aqueles valores que cobrem a conta do buteco. Canso de ouvir que “tem um
cara fazendo um preço muito melhor” dos clientes, que hora ou outra acabam
por me ligar novamente, porque o sujeito fez uma baita M*&%@ que não serve
nem pra usar como textura de cesto de lixo. Portanto confio que ainda vai
assentar uma certa poeira, a verdade deve prevalecer, e o que é bom, tem que
durar. Pelo menos, um pouco mais…

(**) vai um plesentinho do Mr. Bootsy pra ti. Feita com uma compacta pra
furar os severos seguranças da choperia do Sesc, portanto, fotinhaz com
menos pixels e mais intenção.

Abração forte, fica na ativa e vamos seguindo onde for, bro ! Só não nos
abandone sem avisar.
Mais uma vez, meu muito obrigado !”

Simão