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a carta magNa (ou zezé jones, simples assim)…

  Rio, 20/3/84

“Mauricio e Liliane (a dupla dinâmica),

Ontem ouvi (como sempre) o programa que vocês apresentam para nós, rockeiros ávidos pelo conhecimentode novos grupos. Não preciso dizer que adorei e fiquei EMOCIONADA pela homenagem de vocês. Nem precisava. Afinal o rock e uma grande família…
e e lógico que eu AMEI o fato de vocês terem tocado 3 músicas do ECHO (e que gravei, of course). SEVEN SEAS, então eu DELIREI. realmente eu não sei como voces conseguem descobrir e arranjar tantas novidades!
obrigada, também, por ter reouvido o grupo THE SMITHS, principalmente esta música tocada. Ah, eu tenho uma sugestão para vocês, embora eu
não saiba se vai ser uma boa (eu acho que sim). eu sugiro que você, uma vez por semana, faça um especial com um grupo. Por exemplo, num
mês, você escolhe segunda ou sexta e resolve mostrar so o Madness, depois o Public Image e assim por diante. Então, você poderia fazer uma perspectiva
do grupo, desde as primeiras músicas (que são difíceis de serem encontradas aqui, sobretudo se sairam em single) até as últimas. eu acho que seria
legal porque tem muita gente que só conhece uma ou duas músicas de tal grupo e, assim, com o especial você poderia cobrir a carreira do grupo.
Veja o especial do U2, por exemplo. foi um SUCESSO! eu pensei nisso ontem a noite, já que depois que eu ouvi o ECHO, eu não consegui dormir.
As músicas são simplesmente LINDAS! não quero dar uma de fã alucinada porque detesto isso. Estou também louca para ver o resto do Lp do Madness.
A música Michael Cane e a Samantha devem mesmo, como disse a Liliane, serem incluídas, com URGÊNCIA, na programacão da rádio. Eu li algo sobre
o AZTEC CAMERA numa revista americana. Eu só conheco uma música deles, acho que é “obvious”, que você colocou em um de seus programas. gostaria
de saber se eles já tem muitos Lps, porque esta música que eu falei, eu adorei. E, sobre o fato da OBRA PRIMA “PORCUPINE” ter vendido pouco, bem, eu só posso dizer que eu conheco, pelo menos, três pessoas com
este Lp. Eu, um colega e dois primos que eu tenho na louca São Paulo.
Por isso, eu aposto no ECHO e não no THE BEAT (embora eu goste deles
too). Mas eu acho que o porcupine pode (e deve) ter vendido mais. Pelo menos é o que espero como uma ECHO ADDICT. Bem, eu estava pesquisando
os meus “arquivos musicais” (que os meus pais chamam simplesmente de “jornais velhos”. vejam só!) e descobri duas coisas que o JOHN PEEL
disse uma vez. Por isso, eu reproduzo aqui e mando pra vocês dois, de presente. Ai vão: “the BBC is a great quivering mess creeping into the
1940’s, out of the 1920’s” “whoever is doing the bay city rollers, publicity has no sense of shame” nota: eu não sei se voces já ouviram falar no BCR (um grupo bubblegum, detestante e que eu, quando tinha uns 13 anos tive a audácia de comprar uns Lps deles!) bem, acho que já estou torrando a paciência de vocês dois. Continuem na estrada do rock, que é a VIDA
pura e simples. Sabe porque o programa de vocês e o mais importante da MALDITA HIGHER HELL? sem querer desmerecer os outros, mas nós estamos
pela primeira vez, vivendo o rock. Eu e o pessoal que conheco, que nascemos no início dos anos 60, nao tivemos a sorte de viver a década das flores,
e quando conhecemos os grupos de rock dos anos 70, eles já tinham começado e ja estavam na metade da carreira deles. Ora, nós estamos, então, vivendo
os 80s, junto com a musica do U2, PUBLIC IMAGE, ECHO, MADNESS e outros.

Eles marcarão a nossa história e a nossa vida. Eles são MEMORIAS do nosso dia a dia. Quem
não sacar que o rock é algo que muda, sempre, quem se RADICALIZAR, não poderá nunca compreender a essência do rock! e vocês sacaram e mudaram.
É isso aí. A única coisa que a gente pode ser radical é na LIBERDADE.
E aí inclui-se a liberdade (e coragem) para mudar.”

Zezé Jones

“toda criação é uma loucura que da certo”
“music is your only friend” (meu outro lover JIM MORRISON)

o #500tola segue fervendo…

o #500tola ainda está fervendo na moriNga d’aTRIPA… e, pelo andar da carrocinha, a chapa seguirá bem caliente. portanto, o #501 chegará sabe como, né?

agradecimentos1000 a todos que estão reverberando o programa… D+D+D+D+!

lembrando que o endereço programa@roncaronca.com.br segue escancaradão, ok?

enquanto isso, mais fotocas captadas no, já histórico, #500tola…

caramelo 58% direto da destilaria valdeco…

e algumas mandingas que facilitaram o voo…

cheers

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zezé jones abrindo a selva à dentada…

na beirola do #500tola, a presença astral de zezé jones fica ainda mais iluminada… afinal, ela confirmou em cartas, lááááá atrás, por onde o programa deveria e teria de seguir.

zezé tinha uma curiosidade que movia galáxias, um bom gosto sônico de fazer duke ellington chorar de paixão… na boa, tenho certeza absoluta que muitos e muitos ouvintes atuais que jamais ouviram falar Dela seguem colocando na pista todas as vontades-sonhos-ambições-desorietações que cercaram a vida de zezé… oxente, Ela abriu as nossas possibilidades de perceber… isso, de perceber!

zezé jones, UAU… é deusa, mamãe!

cheers

( :

domingo no parque…

Uma noite transcendental com os Rolling Stones no Hyde Park

O segundo concerto dos Rolling Stones no Hyde Park, realizado ontem, num domingo de verão alternando céu azul de sol forte e nuvens ameaçadoras, dentro da atual turnê SIXTY, a primeira na Europa sem Charlie Watts, teve um clima de celebração e afirmação.

A 203ª apresentação da banda na cidade onde se formou e se estabeleceu sublinhou com caneta vermelha o vigor da banda, sua capacidade de recuperação dos mais severos golpes, e sua vontade de seguir adiante até onde for possível – sendo que o “até onde for possível” dos Stones está num nível acima de qualquer outro artista em atividade, como demonstrado ontem, por um setlist salpicado de surpresas e rearranjos (ou exclusão sumária) de clássicos que comparecem a todo show.

E funcionou, em muitos aspectos, como uma festa entre familiares e amigos, com esposas, filhos e netos compartilhando a noite – com o caçula de Mick, Devereaux, vestido de Homem-Aranha, correndo pelo gramado na frente da barreira que separava a multidão de 60 mil pessoas do palco, dando tapinhas nas mãos de quem na plateia estendesse o braço para ele se divertir, seguido de perto pela mãe, a bailarina Melanie Hamrick, e a babá asiática. Ou com a filha mais velha de Mick, Karis, sentada num banquinho no mesmo espaço, ao lado de Chris, seu tio, incomodado a todo instante para um selfie com alguém do público. Enquanto isso, o super jovem Chuck “Chucky” Klapow, coreógrafo de Jagger, permanecia atento aos passos de seu pupilo em ação, registrando alguns pontos-chave em seu celular.

Charlie Watts esteve presente, saudado com um vídeo que precede o show – onde aparece tocando, nas diversas fases de sua carreira – e com falas de Mick e coros de “Charlie! Charlie! Charlie!” ecoando plateia adentro.

E Mick e Keith temperaram sua relação eternamente agridoce com momentos de alegria e espontaneidade genuínas, sorrindo, brincando, se cumprimentando, se surpreendendo – mais de uma vez Keith adiantou uma introdução ou um encerramento, pegando Jagger no susto e exigindo ação imediata do frontman para não desandar a música. A produção é de maior espetáculo da terra, a posição deles é no topo da realeza rock, mas ao vivo os Stones sempre surpreendem ao público e a si mesmos, com tropeços acidentais e freios de arrumação de uma banda de garagem entusiasmada o bastante para não se ater a algumas filigranas.

Para a plateia a primeira surpresa do show ocorreu logo de saída, quando, em vez de “Street Fighting Man”– que tem dado o chute inicial dos shows dessa turnê – , os Stones abriram com uma versão furiosa, jubilante e elétrica de “Get Off My Cloud”, antes de engatar uma terceira e elevar a voltagem ainda mais com uma “19th Nervous Breakdown” ultra-pop e cintilante.

“Tumbling Dice” vem logo em seguida, antes da recém-desencavada “Out Of Time” – cantada a plenos pulmões por um público deleitado, que Mick regia como se estivesse num auditório de TV de um programa de auditório, tamanha é sua capacidade de comandar a plateia (do tamanho que for, talvez quanto maior, melhor) com um misto de autoridade e sedução.

Depois de uma “Angie” protocolar e uma “You Can’t Always Get What You Want” participativa, como semopre, a segunda surpresa – “Like A Rolling Stone”– é precedida de uma introdução que atualizava a brincadeira feita por Mick com uma música que Bob Dylan – “vencedor do prêmio Nobel de Literatura”, ele faz questão de frisar – teria feito para Jagger e o grupo. E “You Got Me Rocking” fecha uma meia hora inicial que pode ser descrita como transcendental.

O que veio depois confirmou as expectativas do repertório-padrão da turnê, mas os primeiros 30 minutos de show no domingo entram para o rarefeito Olimpo onde moram as melhores apresentações dos Rolling Stones em seus 60 anos de carreira.

A combinação de Steve Jordan, na bateria, com Daryl Jones, no baixo, embora sempre atenta à dinâmica da cozinha anterior, comandada por Charlie Watts,  hoje oferece a Mick, Keith e Ronnie uma base diferente, mais pesada, mais funky e menos suingada, respeitando convenções musicais de décadas ma injetando toques e energia próprios, elevando o nível do pique dos shows.

Isso se revela mais claramente em “Miss You”– hoje parece outra música, arranjada para o século 21 – e “Jumpin’ Jack Flash”, desacelerada e mais … sutil, digamos assim.

A última surpresa da noite ocorreu não de maneira sonora, mas visual, quando se percebe, de repente, que Keith Richards passou a noite inteira tocando sem seu anel-assinatura, de caveira. Uma ausência extremamente curiosa e significativa, mas que, por ora, fica sem explicação.

O encerramento triunfal – naturalmente, com “Satisfaction”– coroou duas horas de um show com um sabor e um significado muito especiais (em Londres, caramba!) que, com a forte possibilidade de uma nova volta a cidade ser remota, embora não impossível, teve também um sabor de agradecimento e (pelo menos o início de uma) despedida para um público que hoje reflete um mix geracional vbariadíssimo: estão ali desde o jovem casal carregando um bebê no colo a senhoras que podem estar vestindo camisetas com a famosa língua criada pelo designer John Pasche, mas que parecem com aquela sua tia-avó encarangada, já perto dos 80 anos. De “marinheiros de primeira viagem” querendo uma chance (talvez a última?) de ver ao vivo e em ação um ícone do rock aos “usual suspects” que dedicam a vida a acompanhar todos os shows dos Stones, onde quer que eles toquem, custe o que custar. Dos fãs de primeira hora, que encontram ali uma oportunidade de lembrar quem são, a pais e mães carregando filhos e netos para mostrar a eles qual é a de sua banda favorita.

E para todos eles os Stones mantêm seu apelo e sua capacidade de atração, porque desafiam ao tempo e a percalços que descarrilhariam seres menos resilientes. São a história viva do rock e do pop, ainda sendo escrita, com um capítulo final afastado ano após ano, contra tudo e todas as previsões.  São os criadores e os mestres de um idioma musical que, na verdade, pode acabar depois que a banda cessar de existir. Por isso, deixar de ver os Stones no palco – seu habitat natural, mais que o estúdio, porque são performers, são entertainers – não é uma opção. E, por isso, o mundo vai onde estiverem.

Ainda mais se for em Londres.

José Emilio Rondeau

(DAQUI)