diz aí, andré…

Subject: O monstro acordou?!
“Olá, MauVal, tudo bem?!

Maurício, excepcionalmente, não tecerei linha sequer sobre assuntos musicais. Não posso passar incólume sobre os últimos acontecimentos no Brasa.

O monstro acordou! Sim, ao que parece, ele despertou de sua hibernação, de um estado de letargia que parecia eterno!

Senhoras senhores, não estou descrevendo o despertar de alguma quimera ou qualquer outro ser mitológico. Falo do povo brasileiro, que sai às ruas nesse histórico junho de 2013. Deixando a mitologia e as figuras de linguagem um pouco à parte, eu, que andava desesperançoso com tudo e com todos, respirei novos ares, menos poluído e pesado.

A gênese de todo essas mobilizações, deve-se inicialmente, contra os aumentos abusivos das tarifas de ônibus, trens, metrôs, etc. Capitaneados pelo MPL (Movimento Passe Livre), milhares de pessoas botaram a cara na rua para dizer não a mais essa extorsão promovida por nossos agentes públicos.  Entretanto, todo aquele que se atreve a ter um discurso dissonante do establishment, corre o risco de ser confundido como vândalo o baderneiro. Foi o que aconteceu com os manifestantes no dia 13/06/2013. Para alguns articulistas, o ato não tinha apelo popular, pois boa parte dos manifestantes eram estudantes de classe média, que ainda sonham com uma revolução socialista. Algo parecido eu ouvi ao voltar da faculdade para minha casa naquela noite, ao ver bancos, lojas e pontos de ônibus depredados e pichados: “Não sei pra que eles fizeram isso… Vão todos acordar meio-dia amanhã!” Até então, era senso comum restringir o movimento aos estudantes e, não acreditar na redução das tarifas. Um amigo meu, me dissera a seguinte frase: ”Isso não vai dar em nada!” Será?!

Segunda, dia 17 de junho, de 2013. Tudo leva a crer que será mais um dia rotineiro para mim. O trabalho e a faculdade tomarão meu tempo e pensamentos. No entanto, soube pelas redes sociais, que mais um ato seria realizado no Centro do Rio de Janeiro. Sinto-me impelido de ir às ruas, mas, infelizmente, uma dor de garganta, somada a uma pequena febre me mandam de volta para casa mais cedo.  Pela televisão eu pude acompanhar que a insatisfação não era mais local. A insatisfação não apenas com a máfia dos transportes. A insatisfação era com toda a sujeira acumulada durante anos naquela pia velha e esquecida.  As tentativas de invasão ao Congresso Nacional em Brasília, e a ALERJ no Rio foram sintomáticas. As duas casas legislativas tornaram-se totens negativos, simbolizavam o tirano a ser destronado.

Mais de cem mil pessoas no RJ, e outras milhares em todo Brasil entrariam para História naquela noite.

Após aquele dia histórico, manifestações brotavam de todas as cidades do país. Eu não poderia mais ficar de fora. Além de apoiar as passeatas, era meu dever enquanto pretenso cientista social, acompanhar in loco, quem estava botando o bloco nas ruas.  Participei de três manifestações, em três cidades diferentes: Niterói, onde estudo; Rio de Janeiro onde trabalho e Duque de Caxias onde moro. Três atos repletos de nuances e características peculiares as suas realidades. Irei começar pela segunda, no RJ, a maior de todas. Oficialmente, 300 000 pessoas passaram pela Avenida Pres. Vargas. Contudo, a minha sensibilidade me diz, que havia muito mais do que isso. Jamais vi tantas pessoas na minha vida! A pauta não estava mais direcionada apenas ao preço abusivo das passagens. Mensagens contra a PEC 37, contra a corrupção, contra o aumento do custo de vida, contra a “cura gay”, contra o ato médico, etc… Vi uma infinidade de grupos e indivíduos: marxistas, sindicalistas, anarquistas, bombeiros, coxinhas que só queriam posar para fotos, nacionalistas, homossexuais, favelados, desabrigados e até fascistas. Gente de direita e de esquerda disposta a cuspir e vomitar tudo que estava entranhado há vários anos. Era a chance de realizar uma faxina completa com direito a desinfetante e creolina. Fora algo nunca antes imaginado por minha pessoa, que não acreditava em mais nada. Eu, na minha humilde resignação, acreditava que a nação estaria fadada a deitar eternamente em berço esplêndido.  Nunca me senti tão bem em estar enganado! Que momento!

Um dia antes, também tive a honra de participar do ato em Niterói, cidade onde estudo na minha amada Universidade Federal Fluminense, igualmente histórica, pois mais de 50 000 pessoas ocuparam a principal avenida de Centro de Niterói, a Amaral Peixoto, no dia que as prefeituras cancelaram os aumentos.

Mas, das três passeatas que pude participar, a que me mais me chamou atenção, foi a de Duque de Caxias, minha cidade. Sem o mesmo gigantismo das outras cidades, embora houvesse milhares de pessoas, para minha surpresa. Assim que cheguei em Caxias, por volta de 14:30, um clima de feriado, somado ao de apreensão, pairava no ar. Boatos de arrastões depredações eram ouvidos em todos os cantos da cidade.  De fato fora uma manifestação tensa, desde o seu início. Jovens sem ligação partidária, com reivindicações locais, era a maioria nos protestos. Porém, um grupo destoava da multidão. Em sua maioria, jovens como os demais, entretanto, sua pauta era outra: jogar bombas, chutar lojas e tentar arrumar brigas no meio da multidão. Afinal, a manifestação serviu para que as veias da cidade fossem expostas. Algo, que nós, mesmo morando na Baixada Fluminense, não queremos ver.

O que irá acontecer após o junho de 2013? Sinceramente não sei dizer. Tentar fazer projeções lançar teses, seria pretensão demais de minha parte. Na minha modestíssima opinião, acho que o jogo ainda não terminou. Estamos no meio do primeiro tempo, vencendo por 1 x 0, sofrendo pressão do adversário que é muito forte. Escrevo essas linhas horas antes da final da Copa das Confederações, entre Brasil x Espanha, quando nossa nação parará, mais uma vez, para torcer por nossa seleção.  Entretanto, nos dias de hoje, parar o país só por causa de futebol e carnaval, é coisa do passado. Pelo menos é o que espero…

Grande abraço em você, e em toda nação ronqueira!”

ANDRÉ