diz pra gente, ferraz…

Subject: and so this is christmas!
Salve MauVal!!

Tudo tranquilo? Faz tempo que não escrevo. Estive on the road literalmente e literaturamente ihihi… Nas últimas semanas estive lendo On the road de Jack Kerouac!! Putz, que livro, cara!! Sempre em movimento, numa curiosidade eterna pelo que vem depois da linha do horizonte. Qual é a próxima curtição, as próximas gatas, os próximos sons, a gente, a estrada, o trabalho!!?? Fiquei de cara com o livro! Essa história de viajar e ainda mais pedindo carona é um estilo de vida e tanto! A estrada pela estrada, pelo que ela te traz e para onde ela pode te levar.
Nisso tudo o livro ainda consegue abrir espaço para uma aula de jazz. O livro é ambientado nos EUA dos anos 40 e 50 e o jazz era muito presente na vida desse tempo.
Separei um trecho que gostaria de compartilhar com você e com a tripa:
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“Chegarmos onde, homem?”
“Não sei, mas temos que ir.” E então surgiu um grupo de jovens músicos de bop, desembarcando dos carros com seus instrumentos. Amontoaram-se em frente à boate e entraram; fomos atrás deles. Instalaram-se no palco e começaram a tocar. E lá estávamos nós! O líder era um tipo esbelto, desanimado, de cabelo crespo e boca franzida, ombros estreitos, metido numa camisa esporte larga, de cabeça feita na noite suave, e um ar de autopiedade estampado em seu olhar; apanhou seu sax, franziu as sobrancelhas e começou a sopra, cool e complexo, marcando o ritmo com o pé, com estilo esquivando-se para se afastar dos outros, dizendo um “vai” quase inaudível quando algum dos rapazes se lançava num solo. A seguir, lá estava Prez, um loiro rouco, robusto, elegante com um boxeur sardento, cuidadosamente envolto num terno rayon xadrez, de talhe longo, de uma elegância desarrumada com o colarinho para trás e a gravata desfeita para dar o tom exato de desalinho e indiferença, suando e agarrado ao sax, entrelaçado nele, tocando como se fosse o próprio Lester Young. “Veja só, cara, Prez tem as ansiedades técnicas de um músico comercial, a fim de grana, é o único que está bem vestido, e… repara como ele fica bravo quando desafina, mas o líder da banda, aquele gato maneiro, lhe dá uns toques para não se preocupar e apenas tocar e tocar – o som em si e a exuberância compenetrada da música, isso é tudo que lhe importa! É um artista, ele está orientando o jovem Prez, o boxeur. Mas agora olha só os outros!” O sax-alto, o terceiro, estava nas mãos de um luminoso jovem negro, estilo Charlie Parker, um garoto de dezoito anos, do colegial, com uma bocona escancarada, mais alto do que os outros, e grave. Ergueu seu sax e gemeu alto e pensativamente, extraindo frases como pássaros, como se fosse o próprio Bird Parker, e deixando-as suspensas no ar com a lógica arquitetônica de Miles Davis. Eram os herdeiros dos grandes inovadores do bop.
Outrora fora Louis Armstrong, mandando ver nos lamaçais de Nova Orleans; antes dele, os músicos loucos que entravam nas paradas, aos feriados, e desfaziam as marchas marciais transformando-as em ragtime. Surgiu então o swing e Roy Eldridge, vigoroso e viril, quase rebentando seu trompete ao arrancar dele sonoras ondas de poder, lógica e sutileza – inclinando, com os olhos radiantes e um sorriso encantador -, irradiando-as, para fazer gingar todo o mundo do jazz. Chega então a vez de Charlie Parker entrar em cena, ele era apenas um garoto no casebre de madeira de sua mãe em Kansas City soprando seu sax-alto todo remendado, entre as tábuas, praticando nos dias de chuva, fugindo vez ou outra para assistir à banda do velho Basie e de Benny Moten, que tinha Hot Lips Page e todo o resto – e então Charlie Parker saiu de casa e foi para o Harlem encontrar o louco Thelonius Monk e Gillespie, mais louco ainda -; Charlie Parker, que na mocidade, quando estava pirado, movia-se em círculos enquanto tocava. Um pouco mais jovem do que Lester Young também nascido em Kansas City, aquele bobalhão santo e sombrio no qual está envolta toda a história do jazz porque, ao erguer seu sax, retilíneo e horizontal, sempre colado à boca, ele tocava melhor do que qualquer outro; e à medida que seu cabelo ficava mais comprido e ele ia ficando mais preguiçoso e desleixado, o sax caiu à meia altura; até que ficou definitivamente apontado para baixo e hoje, calçando seus sapatos de solado grosso para não se desgastar nas calçadas da vida, Young sustenta debilmente seu sax, mantendo-o sempre de encontro ao peito, soprando notas fáceis – cool, ainda assim. Cá estavam os filhos da noite americana.”
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UAU! UAU!!! Cara nunca vi um relato literário tão visceral de uma cena musical! Como pode??
Depois disso tudo queria de desejar boas festas e muita força para 2014!!! Para você e para os seus!
Viu ali em cima a trilha sonora da ceia de logo mais?
Abraço
Ferraz